Maria do Céu Rueff, Público, 11.08.2008
Professora Universitária e Membro da Comissão de Ética da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
Empresas
Um dos casos mais polémicos sobre a violação ao direito da confidencialidade médica em meio laboral, aconteceu em Portugal decorria o ano 2002 e ficou conhecido por: "O facto provado n.º 22 no processo do cozinheiro com VIH. Conheça aqui o caso »»
Um dos casos mais polémicos sobre a violação ao direito da confidencialidade médica em meio laboral, aconteceu em Portugal em 2002, e ficou conhecido como "O facto provado nº 22 no caso do cozinheiro com VIH"
O caso
O trabalhador em causa estava há sete anos nos quadros do hotel do Grupo Sana Hotels. O caso teve início em 2002, quando o cozinheiro adoeceu com tuberculose. Na altura esteve um ano de baixa, e, quando regressou ao trabalho, foi mandado ao médico do trabalho do hotel que pediu ao médico assistente mais informações sobre a situação clínica. O médico da medicina no trabalho foi informado pelo médico assistente de que o cozinheiro era VIH positivo, mas que não representava qualquer perigo para os colegas e poderia retomar a atividade em pleno. No entanto, o médico do trabalho considerou-o "inapto definitivamente para a profissão de cozinheiro".
O hotel afirmou que só teve conhecimento da doença do funcionário durante o julgamento e que o médico do trabalho não os informou de que o trabalhador em causa era seropositivo. Mas, avança, que o cozinheiro deveria ter informado "imediatamente de que era portador de VIH, o que não aconteceu, violando o dever de lealdade".
A indignação:
"Num país onde um tribunal de primeira instância dá como provado que "O vírus HIV pode ser transmitido nos casos de haver derrame de sangue, saliva, suor ou lágrimas sobre alimentos servidos em cru ou consumidos por quem tenha na boca uma ferida na mucosa de qualquer espécie" (convidamos a que analisem com atenção o uso do português na frase) e que tal decisão é ratificada pela Tribunal da Relação, pelo Supremo Tribunal de Justiça e apoiada, em comunicado, pelo Conselho Superior da Magistratura, estão reunidas as condições para excluir legalmente qualquer ser humano com infeção VIH de todo o contacto social no nosso país, com base numa mentira científica. Consideramos que só com o empenho dos melhores no conhecimento científico, político, direitos humanos, jurídico, do estado de direito democrático e meios comunicação social se poderá mudar esta lamentável situação. Sozinhos (somos) incapazes de obstar à acumulação deste tipo de decisões legais, disparatadas, ignorantes e danosas. A manter-se este estado das coisas estão criadas as condições para um aumento exponencial da discriminação, estigma e exclusão das pessoas que vivem com VIH.
O GAT subscreve também os textos abaixo, do Pedro Silvério Marques, fundador, e actualmente membro do Conselho Consultivo, do GAT e o texto da Ana Abecasis e Anne-Mieke Vandamme publicado no último número da revista do GAT "Acção & Tratamentos""", GAT
A razão:
"As declarações que constam no texto distribuído pela Agencia Lusa a que nos referimos são um fino exemplo de justificações enviesadas, contorcionismos jurídicos, revelar de culpas e endosso de responsabilidades pela decisão final dos tribunais de considerar "justificada e legitima a decisão" do Grupo Sana Hotels de terminar o contrato de trabalho com um cozinheiro portador do VIH. A começar no eterno denunciador - o médico assistente, que não cumpriu o seu dever de confidencialidade sobre o estado de saúde do seu doente, passando pela sempre singular figura do médico do trabalho - a quem a dualidade de obediências faz, normalmente, esquecer a ética médica para satisfazer o patrão que lhe paga - o patrão, pois claro, que diz que não sabia quando despediu mas que invoca violação do dever de lealdade para dar por terminado o vinculo laboral, incluindo o advogado do queixoso - que não terá apresentado qualquer parecer médico-científico e que só fez chegar à Relação um parecer jurídico "fora de prazo" e que não terá recorrido adequada e atempadamente de factos fixados e decisões anteriores.", Pedro Silvério Marques fundador, atualmente membro do Conselho Consultivo e Coordenador do Centro Anti Discriminação VIH/SIDA
O impacto desta notícia em Portugal, fez recuar anos-luz, todo o trabalho de ativistas e outras entidades de travar ações discriminatórias contra as pessoas que vivem com o VIH. Pior ainda, validou as mesmas.
A SER+ como Associação que se empenha na integração das pessoas que vivem com o VIH no meio laboral, assegurando os seus direitos, tem vindo a sentir os danos colaterais desta notícia, ou seja, a leviandade com que as empresas, principalmente, do sector da restauração, perguntam e pedem para fazer o teste ao VIH, servindo-se disso para violar o Artigo 23.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que diz "Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego."
A infeção pelo VIH não é uma questão relacionada com o local de trabalho e deve ser abordada como qualquer outra doença ou situação de saúde que possa existir nesse meio. Tal é necessário não apenas porque a questão do VIH/SIDA atinge os trabalhadores mas também porque o local de trabalho, que se insere na comunidade local, tem uma função a desempenhar na luta global contra a propagação e os efeitos da epidemia.
Senhor empresário, esta informação é para si:
Como entidade empregadora responsável, quererá recrutar um conjunto de profissionais de elevada qualidade. Isso significa que o recrutamento deverá ser concretizado com base nas aptidões pessoais e profissionais dos candidatos e não em qualquer inaceitável discriminação.
Também significa defender os colaboradores e assegurar que não se despeçam nem sejam despedidos como resultado de experiências discriminatórias, preconceituosas e prejudiciais no local de trabalho. Um exemplo de tão inaceitável experiência é discriminar alguém pelo risco agravado de saúde, o que inclui, discriminar com base no estatuto serológico positivo para a infeção pelo VIH.
A proteção legal
A Lei 46/2006, proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde, isto significa que, o Estado Português, deve proteger e defender qualquer cidadão que seja discriminado pela entidade empregadora quando esta, passamos a transcrever, "adote qualquer procedimento, medida ou critério, diretamente... ou através de instruções dadas aos seus trabalhadores ou a agência de emprego, que subordine a fatores de natureza física, sensorial ou mental a oferta de emprego, a cessação de contrato de trabalho ou recusa de contratação;" e, ainda, que "a produção ou difusão de anúncios de ofertas de emprego ou outras formas de publicidade ligada à pré-seleção ou ao recrutamento, que contenham direta ou indiretamente, qualquer especificação ou preferência baseada em fatores de discriminação em razão da deficiência; "e, por fim, seja adotada “prática ou medida que no âmbito da relação laboral discrimine um trabalhador ao seu serviço."
Viver e trabalhar com o VIH
Em meados da década de 80 foi autorizado o primeiro medicamento, o AZT, que demonstrou alguma eficácia no controle da replicação do VIH e, durante os dez anos seguintes, novos medicamentos, mais específicos, foram permitindo um acréscimo gradual da esperança de vida das pessoas com VIH.
Em meados da década de 90 que ficaram disponíveis medicamentos que, com ação em diferentes fases da replicação do vírus, permitiram desenhar e definir um tratamento altamente eficaz. Se antes dessa data se admitia que, em países com recursos em termos de saúde, a infeção pelo VIH poderia levar entre 8 a 15 anos até criar uma situação de grave ameaça à vida ou até mesmo a morte da pessoa infetada, hoje, desde que o diagnóstico seja feito atempadamente, o tratamento seja prescrito antes do sistema imunológico estar debilitado e seja cumprido com rigor, a pessoa com VIH terá uma esperança de vida semelhante à população em geral.
Como tal é um erro pensar-se que uma pessoa que viva com o VIH irá perder mais dias de trabalho por estar doente que qualquer outro colaborador. Um estudo realizado nos Estados Unidos demonstrou não haver diferenças significativas relativamente ao número de dias perdidos por motivo de doença entre 1800 trabalhadores que viviam com o VIH e trabalhadores não infetados. Na realidade, a maioria dos inquiridos deste estudo não tinha tirado, no último ano, nenhum dia por motivos de doença relacionada com a sua infeção pelo VIH.
Excluindo o meio hospitalar, em nenhum ambiente de trabalho existe risco do vírus de imunodeficiência humana (VIH) ser transmitido através dos contactos normais do quotidiano tanto para os colegas como para o público em geral. Lembre-se, senhor empregador, a transmissão acontece somente de 3 formas, clique aqui para saber quais são »
Poderão existir, por vezes, algumas necessidades sentidas pelos colaboradores relacionadas com o facto de viverem com o VIH que têm de ser respondidas através de "ajustamentos razoáveis". Um ajustamento razoável é uma mudança no local de trabalho ou nas funções que remova uma desvantagem substancial (mais do que mínima ou trivial) que a pessoa que viva com a incapacidade possa experienciar pela sua condição de saúde.
Subscreva boas práticas – encoraje a oferta de boas candidaturas
É importante estar desperto e sensibilizado, para a possibilidade de se confrontar com algumas preocupações típicas de quem vive com o VIH e que procura trabalho. Desde o princípio desta epidemia que o estigma e a discriminação têm sido uma das piores consequências para as pessoas que vivem com esta patologia. As pessoas que vivem com o VIH podem não querer contar que vivem com a infeção pelo VIH quando procuram emprego, porque:
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Podem não se considerar "incapazes" ou "diminuídas" nas suas capacidades apesar de estarem protegidas pela lei;
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Podem achar que contar que vivem com o VIH as torna vulneráveis a ações discriminatórias por parte da entidade patronal;
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Podem ficar preocupadas que o seu estatuto serológico para o VIH seja denunciado e que isso promova discriminação por parte dos colegas.
O recrutamento tem que ter tudo isto em conta e deverá, cuidadosamente, repensar e considerar como deverá lidar e responder a alguém que informe que vive com o VIH ou com qualquer outra incapacidade. Uma forma inteligente de encorajar boas candidaturas é claramente subscrever - e agir em conformidade - um compromisso para a diversidade e para a igualdade. Ou, até mesmo, ter uma política específica para a infeção pelo VIH.
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De forma a evitar certos constrangimentos, não faça perguntas aos candidatos sobre o seu estado de saúde ou sobre uma potencial incapacidade a menos que esteja absolutamente certo que essa informação é fundamental para a função que está a recrutar. E, se assim for, é importante que tenha sensibilidade suficiente de assegurar ao candidato que ele se encontra em iguais circunstâncias de oportunidade que os restantes candidatos e que, nem você nem a empresa que representa, discrimina com base no risco agravado de saúde ou pelo estatuto serológico positivo para o VIH, pois representa uma entidade, pública ou privada, que está disposta a fazer os ajustamentos razoáveis necessários no local de trabalho, caso seja preciso e a informação sobre o estado de saúde dos colaboradores é estritamente confidencial.
Formação do pessoal de direção e quadros e dos responsáveis pelo pessoal
O pessoal de gestão e pertencente aos quadros deve não apenas participar nos programas de informação e de educação que visam o conjunto dos trabalhadores como também beneficiar de uma formação para:
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Estar apto a explicar e responder às questões sobre a política da empresa em matéria de VIH/SIDA;
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Estar bem informado sobre o VIH/SIDA ajudando os outros trabalhadores a ultrapassar os preconceitos sobre a propagação do VIH/SIDA no local de trabalho;
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Explicar as possibilidades razoáveis que, caso seja necessário, possam ser oferecidas aos trabalhadores infetados pelo VIH ou doentes com SIDA e ajudá-los a continuar a trabalhar durante o máximo tempo possível;
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Identificar e lutar contra os comportamentos, condutas ou práticas que desfavoreçam ou marginalizem os trabalhadores infetados pelo VIH ou doentes com SIDA;
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Estar apto a poder aconselhar sobre os serviços de saúde e as prestações sociais existentes.
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Se reside na linha de Cascais venha fazer o teste para o VIH, Hepatite B e C na SER+ |
Poderá conhecer o seu estatuto serológico para o VIH, Hepatites B, C e Sífilis, nas instalações da SER+ (em Cascais) ou na nossa Unidade Móvel de Saúde (que circula nos concelhos de Cascais e Oeiras).
O teste é gratuito, anónimo e confidencial, e tem os resultados em 20 minutos.
Na sede da SER+ os rastreios podem ser realizados às:
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2ª feira: entre as 9:20 e as 12.40h e as 14h e as 16.40h
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3ª feira: entre as 9:20 e as 12.40h
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6ª feira: entre as 9:20 e as 12.40h
Pede-se marcação prévia através do telef. +351 214 814 130 ou +351 910 905 974 ou através do email: alexandra.aguiar@sermais.pt.
Na Unidade Móvel o rastreio é feito por ordem de chegada. Poderá conhecer a rota da Unidade Móvel na nossa página de Facebook, na página de Instagram @diagnosticarnalinha www.instagram.com/diagnosticarnalinha ou através do telem. 910 905 974.
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